quarta-feira, 25 de abril de 2012

Cântico Negro



"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!

sábado, 14 de abril de 2012

telefônica




"Sua chamada está sendo encaminhada para caixa de mensagem"



Talvez seja só

problema com a linha

Talvez você esteja ocupada demais

para atender ligações

e por isso o desligou

Talvez seja o destino,

não querendo te atrapalhar

te deixando em paz

com quem eu sei que agora está

Talvez tenha sido melhor assim

Talvez eu tenha tentado tarde

demais

ou talvez seja só problema com a linha

telefônica

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Carta pra não mandar

abril
(e eu não faço idéia de quanto sentimento pode caber em mim)

14 de abril, pra ser mais especifica
não que isso me signifique algo, hoje
mas naquele 14
de abril,
fiz questão de por ela passar
e perguntar, tão direta
- o que devo fazer?
ela não soube responder
nunca soube
de nada
e
sempre soube que nunca soube
de nada

lembro tão bem
daquela manhã fria
que aos poucos se tornava
quente
e eu tão confusa
hoje me vejo, ainda
confusa

e agora sentada, no chão da varanda
descalça
na frente de uma tela
sozinha,
sem lua
sem ela

e sem o resto todo

suspiro
e por esse instante
tenho a certeza
de que estou exatamente onde queria estar
não que naquele não tenha pensado
em telefonar
e dar meia volta
perder a carona
te dizer,
volta
aqui é o teu lugar

não o fiz
e agora não sei
se sensatez
ou covardia
ou

...

de qualquer forma,
não o fiz
aliás
- o que mesmo devo fazer?
ela não soube responder
nunca soube

sexta-feira, 16 de março de 2012

Rimbaud

I

A gente não é sério com dezessete anos.
— Uma bela noite, longe dos chopes e do anseio
Dos cafés barulhentos de lustres soberanos
— Vamos sob as tílias, verdes do passeio.

As tílias cheiram bem nas boas noites de junho!
O ar é às vezes tão doce que fechamos os olhos;
A cidade não está longe — o vento é testemunho —
Há perfumes de vinhedo e perfumes de cerveja...

II

— Eis que percebemos um pano pequenino
Azul-escuro, ladeado por um pequeno galho,
Com uma estrelinha má, sumindo
Aos doces arrepios, branca como orvalho...

Noite de junho! Dezessete anos! Embriagados.
A seiva é champanhe e lhe sobe à cabeça...
Divagamos; sentimos um beijo nos lábios
Que palpita lá, feito um bichano...

III

O coração louco vagueia como num romance,
— Quando, na luz de um pálido lampião,
Passa uma senhorita com encantos de relance,
Na sombra do colarinho temível do seu pai...

E, já que ela lhe acha imensamente ingênuo
Enquanto deixa trotar as suas botinas,
Ela se vira, alerta com um movimento tênue...
— Nos teus lábios então morrem as cavatinas...

IV

Você está apaixonado. Tomado até o mês de agosto.
Você está apaixonado. Seus poemas a fazem rir.
Todos os seus amigos fogem, você é de mau gosto.
— E a adorada, uma noite, concedeu-lhe uma carta!...

— Esta noite... — você entra nos cafés soberanos,
Você pede limonada ou um chope cheio...
— A gente não é sério com dezessete anos
E quando tem as tílias verdes do passeio.

quinta-feira, 15 de março de 2012

pare que eu quero descer

neste ônibus
não há sossego
nem sanidade
há sim, um manequim
apenas
com meus pés despidos
sob seus belos seios

pare!
e vista o manequim de alma
e sem cabeça
- pare! pois já estamos
quase

e não suporto seu teatro

pare e
vista-se
com sua máscara tão cheia
de vazios
vista-se com suas verdades de mentiras
vista-se com suas mais mentiras
que verdades
e então vista-se com o que de mim
encontrar

neste ônibus,
há apenas um manequim
e
há também quem não entenda
a relação entre um manequim
e um ônibus
repleto de cabeças
sem almas
ou vice-versa

vista-me, e por favor
devolva-me.
se por aí
me encontrar

treze de novembro de dois mil e onze

Ela
estava certa

Eu não sei gostar
não sei ter, nem
perder
não sei me abrir
ou conversar

Eu não sei
amar.

Aliás, eu nem sei
o que é isso

E foi.
naquele Treze de novembro,
de dois mil
e 11
que eu a escrevi:
"Estás certa!
- em cada palavra dita
e doída -"

repito,
estás certa

eu
"Concordo!
- com cada palavra dita
e doída-"

(lembrando que
talvez nem isso eu saiba)

Ela,
que com flores mortas
confessou a mim
o atordoado medo
que é,
perder.

Hoje - e amanhã e depois -
poderá dormir
com a pálida certeza
de que simplesmente não há (mais)
o que,
perder

sexta-feira, 8 de julho de 2011

00:08

 

Ela e algumas outras Vadias que passaram na minha vida
Encontrei a Dani umas duas
vezes esse ano.

A Amanda terminou com o namorado
E parece tão louca quanto antes.

A Cecília está estudando Teatro
em Buenos Aires.

Não vejo a Clarisse
deve fazer um ano.
Ela falava demais
Sobre cinema, poesia e música
Sem saber nada sobre cinema
Poesia e música.

A Heloisa diz que não precisa mais de mim
E está escrevendo bons poemas.

Encontrei a Melina na universidade
Com um namorado sem sal.

A Alice continua estudando
pro vestibular,
Qualquer dia desiste.
Pensar nunca foi o forte dela.

A Monique parou de usar lentes.
Nunca mais vi a Alessandra.
Nem a Bruna,
Nem a C...

Dizem que a Duda
Anda chupando qualquer cara.
Ela nunca foi muito boa nisso...

A Juliana namora um sujeito
Com pinta de veado.

E onde está a Lorena?
Ouvi histórias...

A Maria me ligou desesperada
Achando que tava grávida,
Não era meu, mesmo por que
Nunca tive a oportunidade.

A Beatriz ficou louca
Na Austrália,
Enquanto eu enlouqueci aqui...
Teve um filho há dois meses...
Também não tive a oportunidade;

E eu bebo todos os dias,
Bocejando meu tédio.
Conheci esta garota
Num bar, domingo,
O nome dela é Saudade
E ela dorme comigo
Todos as noites...